Polícia prende engenheiros que atestaram segurança da barragem em Brumadinho e gerentes da Vale
Justiça autorizou cinco mandados de prisão e sete mandados de busca em São Paulo e Minas
RIO E SÃO PAULO — Cinco pessoas foram presas nesta terça-feira por ligação com a tragédia de Brumadinho (MG). Em São Paulo, a polícia deteve dois engenheiros da TÜV SÜD, prestadora de serviço da Vale que atestou a segurança da barragem 1 da Mina do Feijão no fim do ano passado. Em Minas Gerais, a operação prendeu um geólogo e dois gerentes da Vale responsáveis pela administração da obra e pelo licenciamento ambiental.
Também foram cumpridos sete mandados de busca e apreensão em São Paulo e Minas. Um dos endereços visitados pela polícia foi o escritório da empresa alemã TÜV SÜD na capital paulista.
Todos os mandados de prisão valem por 30 dias e foram expedidos pela juíza Perla Saliba Brito, da comarca de Brumadinho, a pedido do Ministério Público Estadual. O desastre causou 65 mortes e deixou 279 desaparecidos, segundo boletim da Defesa Civil de Minas , divulgado na noite desta segunda-feira. As buscas por mais vítimas da tragédia recomeçaram na manhã desta terça-feira.
Os dois engenheiros presos em São Paulo são Makoto Namba e André Yum Yassuda. Eles assinaram laudos feitos pela TÜV SÜD em junho e setembro de 2018 garantindo que a barragem que rompeu na última sexta-feira estava em segurança. Em Minas Gerais, foi preso o geólogo da Vale César Augusto Paulino Grandshamp, que também atuou nos relatórios da empresa alemã.
“A tragédia demonstrou não corresponder o teor desses documentos com a verdade, não sendo crível que barragens de tal monta, geridas por uma das maiores mineradoras mundiais, se rompam repentinamente, sem dar qualquer indício de vulnerabilidade”, afirmou a juíza Perla, no despacho que autorizou as prisões.
Outros dois alvos da operação detidos em Minas Gerais são gerentes do Complexo Minerário Paraopeba, do qual faz parte a barragem da Mina do Feijão: Ricardo Oliveira, gerente de meio ambiente, saúde e segurança; e Rodrigo Arthur Gomes de Melo, gerente executivo operacional.
Os dois são responsáveis pelo licenciamento e funcionamento das estruturas, incluindo “o monitoramento das barragens que se romperam”, segundo a juíza. De acordo com o despacho, a prisão é “imprescindível para a elucidação dos fatos e apuração da prática, em tese, de homicídio qualificado, além dos crimes ambientais e de falsidade ideológica.”
Lei prevê que empresa ateste segurança
Para o advogado Marcellus Ferreira Pinto, consultor da Unido, agência de desenvolvimento industrial da ONU, o caso apresenta uma das principais brechas na legislação ambiental, que coloca na mão das empresas boa parte da responsabilidade de atestar a segurança de suas barragens. No caso das mineradoras, esse tipo de inspeção, como a feita pela TÜV SÜD, é equivalente a inspeções particulares feitas em edifícios.
— A empresa que escolhe quem vai executar o serviço, escolhe também qual o método que vai ser utilizado. Pode contratar um escritório de engenharia e pedir para fazer uma inspeção visual. Pode contratar um escritório e pedir uma análise profunda — diz.
Para Ferreira Pinto, o próximo passo da operação deve ser buscar os responsáveis pelas inspeções feitas pelo poder público. Cabe ao governo checar os relatórios e, embora não seja obrigado a fazer vistorias complementares, pode marcá-las.
Para o advogado, não há possibilidade de que os engenheiros, um mês antes do rompimento da barragem, não tenham percebido sinais de que a construção estava sob risco.
— Não é a primeira vez. É uma reincidência. A lei penal tem que ser aplicada com o máximo rigor possível nesse caso para servir de exemplo para quem for atuar nessa área ter consciência de que será penalizado — disse.
Delitos feitos na ‘clandestinidade’
A juíza frisou que a apuração da responsabilidade pela tragédia de Brumadinho é complexa pois alguns delitos foram “perpetrados na clandestinidade”. Por isso, ela determinou, também, a apreensão de celulares para que a polícia possa checar mensagens trocadas entre os cinco detidos.
Os telefones, computadores e outros documentos recolhidos pela polícia devem ser enviados para Minas Gerais ainda nesta terça-feira. Namba e Yassuda deixaram o prédio da Polícia Civil de São Paulo por volta das 10h e pegariam um avião para Belo Horizonte, onde serão ouvidos pelo MP.
Em nota divulgada logo após a operação, a Vale informou que está colaborando “plenamente” com as autoridades e dando apoio “incondicional” às famílias atingidas.
A TÜV SÜD respondeu que “lamenta profundamente o rompimento da barragem”. A empresa diz que fez duas avaliações da obra a pedido da Vale: uma revisão periódica da segurança da barragem (junho de 2018) e uma inspeção regular da segurança da barragem (setembro de 2018). Mas, devido às investigações, não vai se pronunciar neste momento. Ainda segundo o comunicado, a empresa está “colaborando com as autoridades”.
Fonte: O Globo.