ESG no Banco: Raio-X Revela Líderes e Urgências no Setor Financeiro

Segunda avaliação do RASA expõe avanços tímidos e a persistente falta de transparência como barreiras para a sustentabilidade bancária no Brasil.

Redação | Green Business Post | 19 mar 2025.

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Uma análise profunda e abrangente do cenário da sustentabilidade no setor financeiro brasileiro acaba de ser divulgada pelo projeto RASA (Resultados da Avaliação de Sustentabilidade de Ativos). A segunda edição da avaliação, apresentada em uma live no canal do YouTube “SIS – Soluções Inclusivas Sustentáveis”, oferece um panorama detalhado sobre como bancos comerciais, múltiplos e cooperativos estão integrando critérios ESG (Ambiental, Social e de Governança) em suas operações.

O RASA, que em sua primeira avaliação no final de 2022 analisou um conjunto de instituições financeiras, ampliou seu escopo nesta segunda rodada, incluindo o BASA e o BNB, bancos de atuação regional com forte foco em fomento. Além deles, os sete maiores bancos brasileiros, os dois maiores cooperativos e o Rabobank, este último reconhecido por suas práticas exemplares no agronegócio, foram reavaliados.

A metodologia do RASA vai além da análise de políticas, observando seis grandes temas:

Gestão de Riscos (peso de 40%): Avalia a identificação de riscos, as bases de dados socioambientais consultadas, a diligência nos processos de crédito e investimento, o peso da avaliação socioambiental na decisão, o monitoramento e a mitigação de riscos.

Políticas (peso de 10%): Analisa a amplitude das políticas de sustentabilidade, incluindo temas como riscos climáticos, ambientais e sociais, e políticas setoriais.

Produtos Financeiros com Impacto Positivo (peso de 10%): Considera a oferta e o volume de produtos que financiam a transição para uma economia mais sustentável.

Composição do Portfólio (peso de 25%): Examina a distribuição por setor econômico, o conhecimento sobre a localização das atividades financiadas e o perfil de risco socioambiental das empresas.

Governança da Sustentabilidade (peso de 10%): Avalia a estrutura de gestão da sustentabilidade, diversidade nas lideranças, tamanho da equipe de sustentabilidade, treinamento em ESG e integração de fatores de sustentabilidade na remuneração.

Envolvimento em Controvérsias Socioambientais (peso de -5%): Penaliza instituições envolvidas em controvérsias, com base em fontes como o Ministério Público, Procons e notícias da imprensa.

Uma mudança significativa nesta segunda avaliação foi a ponderação das carteiras de crédito e investimento, que agora é feita de forma proporcional ao balanço de cada banco, refletindo a realidade de instituições com diferentes perfis de atuação.

Resultados Gerais: Liderança Mantida, Mas com Notas Longe do Ideal

Os resultados gerais para crédito e investimentos revelaram uma continuidade no topo, com o Rabobank mantendo a primeira posição. O BTG Pactual permanece em segundo lugar, muito próximo do líder, enquanto o Sicred ascendeu à terceira posição. Destaque para o Banco do Brasil, que subiu várias posições no ranking geral. No ranking específico de crédito, o BTG Pactual lidera, com o Rabobank em terceiro.

Apesar de algumas notas mais altas nesta edição, a pontuação máxima obtida em muitos temas ainda está distante do ideal. Por exemplo, no tema de políticas, a nota máxima possível era 10, e a maior alcançada foi de 6,428 . Isso demonstra uma lacuna significativa entre o potencial e a prática na implementação de políticas de sustentabilidade robustas e setoriais.

Falta de Transparência e a Gestão de Riscos: Desafios Persistentes

Um dos pontos críticos levantados pela avaliação é a falta de transparência em diversos aspectos. Em relação à gestão de riscos, por exemplo, muitos bancos não divulgam as bases de dados socioambientais consultadas ou as diligências realizadas para além do exigido para o Crédito Rural. Essa falta de informação impede uma avaliação precisa de como os riscos são identificados e gerenciados.

Outro ponto preocupante é o recorte nas operações financeiras avaliadas sob a perspectiva socioambiental. Muitos bancos estabelecem limites mínimos de valor (como R$ 8 milhões na Caixa Econômica e R$ 10 milhões no Banco do Brasil), deixando de fora um volume considerável de transações com potencial risco socioambiental10 …. Além disso, poucos bancos divulgam o percentual de operações de crédito ou investimento negadas com base em avaliações de risco socioambiental, dificultando a comprovação de que essas avaliações de fato influenciam as decisões financeiras.

A composição do portfólio também carece de transparência. Embora alguns bancos divulguem a composição setorial, o conhecimento sobre a localização das atividades financiadas e o perfil de risco socioambiental das empresas ainda são informações raramente disponibilizadas4 …. Essa falta de dados dificulta o acompanhamento e a avaliação do impacto real das atividades financiadas.

Na governança, apesar de alguns avanços na inclusão da sustentabilidade em diretorias e na consideração de fatores ESG na remuneração, a transparência sobre o peso desses fatores e a dimensão das equipes de sustentabilidade ainda é baixa. Treinamentos aprofundados em sustentabilidade para áreas estratégicas também são raramente encontrados.

Oportunidades e o Envolvimento em Controvérsias

A avaliação também buscou identificar produtos financeiros com impacto positivo, mas o percentual desses produtos nas carteiras dos bancos ainda é pequeno e a transparência sobre seus critérios e volume é limitada.

No que diz respeito ao envolvimento em controvérsias socioambientais, a avaliação, baseada em fontes públicas e notícias da imprensa, identificou alguns bancos com pontuações negativas nesse quesito.

Debate e Perspectivas Futuras: Engajamento e Regulação como Caminhos

A apresentação dos resultados do RASA foi seguida por um debate enriquecedor com Marcos Wayman, do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), e Giovana Valentim, da Conectas Direitos Humanos.

Wayman destacou o RASA como um instrumento valioso para trazer transparência e avaliar o financiamento da economia privada em áreas cruciais para enfrentar desafios como as mudanças climáticas. Ele apontou o fraco desempenho dos bancos públicos como um ponto de atenção e defendeu a necessidade de maior transparência e engajamento com diretores e acionistas para impulsionar melhorias. Wayman também conectou o RASA com a agenda dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) do Brasil, ressaltando a importância de instrumentos que constranjam a economia da degradação. Ele também sugeriu que o RASA possa, no futuro, agregar variáveis de emissões das próprias instituições financeiras.

Giovana Valentim parabenizou a amplitude e a metodologia do RASA, estabelecendo paralelos com o Guia dos Bancos Responsáveis (GBR). Ela reforçou que os resultados em temas como mudanças climáticas e direitos humanos ainda são pouco animadores, evidenciando a necessidade de expansão e melhoria nas políticas bancárias. Valentim também destacou a importância do engajamento com os bancos e a necessidade de mecanismos de reclamação e denúncia mais eficazes para lidar com impactos socioambientais negativos.

Em resposta aos debatedores, Luciane Moessa, coordenadora do RASA, mencionou o início de um processo de engajamento com bancos e investidores e justificou a não avaliação dos impactos diretos das instalações bancárias devido à sua menor proporção em relação ao impacto das carteiras de crédito e investimento.

Durante a sessão de perguntas e respostas, Isadora Carvalho, da Global Canopy, compartilhou os resultados de um estudo sobre o financiamento da pecuária e seu impacto no desmatamento, corroborando a necessidade de maior transparência e ação por parte das instituições financeiras. Karina Pimentel, do IDEC, também reforçou a persistente falta de transparência como um dos principais desafios observados em pesquisas do setor.

Questionada sobre os caminhos para avançar a agenda ESG no setor financeiro, Luciane Moessa apontou a regulação mais robusta, a capacitação dos tomadores de decisão nos bancos e a maior transparência de dados ambientais como elementos cruciais. Marcos Wayman complementou, ressaltando a importância do protagonismo da sociedade civil e da união de escolhas individuais com processos coletivos baseados em dados e ciência. Giovana Valentim finalizou, reforçando a necessidade de conectar o micro com o macro e de construir redes e plataformas para mobilizar a sociedade em prol da sustentabilidade financeira.

O RASA se consolida, assim, como uma ferramenta essencial para monitorar e impulsionar a agenda ESG no setor financeiro brasileiro. Seus resultados, embora revelem avanços em algumas áreas, escancaram a urgência de maior transparência, políticas mais ambiciosas e uma integração efetiva dos riscos e oportunidades socioambientais nas decisões financeiras. A pressão de stakeholders, a atuação de reguladores e a crescente conscientização da sociedade civil serão determinantes para que o setor financeiro possa, de fato, contribuir para uma economia mais sustentável.

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